
Há decisões acertadas. Há outras muito acertadas. Foi o caso do Brasil no momento em que a nossa diplomacia deu sinal verde para Bolsonaro visitar a Rússia dias antes de Putin invadir a Ucrânia. Uma pequena indecisão ou deslize poderia ter sido desastroso naquela oportunidade.
Embora a palavra final sobre a viagem tenha sido do presidente, a decisão não foi dele, pelo menos não só dele. Decidiu sua ida respaldado pelas ponderações da diplomacia brasileira. Mediram milimetricamente os prós e os contras. Havia argumento de todos os lados.
Os críticos
Os oposicionistas, e até alguns situacionistas, ficaram acesos nas críticas. Como o presidente poderia ser tão irresponsável e visitar um país que estava batendo boca com um dos nossos mais importantes parceiros econômicos? Haveria retaliação na certa. Agradaria aos russos, mas criaria resistências em Biden.
Sem contar que, segundo esses mesmos críticos, o primeiro mandatário norte-americano andava de bico virado com o chefe do Executivo brasileiro desde que concorreu com Donald Trump. Afinal, não é segredo nenhum o bom relacionamento de Bolsonaro com o ex-presidente dos Estados Unidos. Inclusive o fato de que tenha torcido ostensivamente para a sua reeleição.
Ventos favoráveis
Deu tudo certo. Conseguimos os fertilizantes de que precisávamos para tocar a nossa agricultura. Os quase trinta navios carregados com esses insumos já chegaram ao nosso país. Os americanos não se mostraram tão incomodados como alguns previam. Não nos envolvemos em um confronto que nada tinha diretamente a ver conosco. E vida que segue.
E para completar o roteiro de final feliz, há poucos dias Biden insistiu para que Bolsonaro participasse da 9ª Cúpula das Américas, em Los Angeles. Mais um golaço. Os dois conversaram amistosamente em ambiente aberto, liberado para quem quisesse ver; e depois reservadamente para troca de informações e acordos mais sigilosos.
Os diplomatas brasileiros demonstraram possuir o DNA do Instituto Rio Branco, pois continuam a pregar que diante dos confrontos entre as nações devemos manter neutralidade e buscar soluções com diálogos e entendimento.
Ainda que sofresse enorme pressão dos opositores, da mídia, dos países envolvidos no confronto e até dos próprios bolsonaristas, o Itamaraty levou tudo na base do silêncio e da boa conversa.
Hoje fica simples fazer essa análise. Após mais de cem dias de conflito, já sabemos que a Rússia não sucumbiu às sanções dos países que aderiram à causa ucraniana. Ao contrário, parece que as consequências foram até mais graves para o resto do mundo.
Sofremos menos
Economias que viviam estabilizadas experimentam níveis inflacionários desconhecidos há décadas. Há queda quase generalizada do PIB. Sofrem com falta de combustíveis, seguida da alta incontrolada dos preços. Começam a escassear os alimentos, condição agravada com valores proibitivos.
Pelos números apresentados no Brasil, somos o país que conseguiu enfrentar a crise mundial com mais competência.
Temos alta no preço dos combustíveis, pressão inflacionária, baixo crescimento do PIB. Os nossos indicadores, entretanto, são de causar inveja na maior parte dos países.
Caímos menos e revertemos a nossa posição com mais eficiência que muita gente poderosa no planeta. Os pessimistas são obrigados a rever com frequência nossas projeções para patamares mais favoráveis.
Os louros
Como já foi mencionado, esse crédito não pode ser colocado apenas na conta de Bolsonaro. Por outro lado, temos de considerar que foi ele que escolheu as pessoas que estão tomando as decisões acertadas. Foi de sua escolha o ministro Paulo Guedes, assim como foi sua a responsabilidade de indicar o nome de Carlos França para o Ministério das Relações Exteriores. Em uma função como a de presidente da República, em certas circunstâncias, vale mais estar bem assessorado que tomar decisões por conta própria.
Responsabilidade não se delega. Se houvesse algum equívoco nessas ações, a culpa recairia toda nas costas do presidente. Os louros, por outro lado, são creditados a ele. Nessa posição, todavia, por mais que o primeiro mandatário do país possa se aconselhar aqui e ali, na hora de decidir estará sozinho. E nesse momento solitário terá de traçar os rumos do país. Gostando ou não dele, temos de torcer para que acerte sempre – para o bem de todos nós.
Entra governo, sai governo, e a nossa diplomacia, salvo uma ou outra quase insignificante escorregadela, continua mantendo o admirável exemplo deixado pelo Barão do Rio Branco. Que continue assim.